Pe. Adroaldo Palaoro, sj
“…e os enviou dois a dois, na sua frente,
a toda cidade e lugar aonde Ele própria devia ir” (Lc 10,1)
Ainda
carregamos resquícios de uma falsa visão da santidade como afastamento do mundo
e de seus perigos e buscar refúgio no deserto, nas montanhas ou nos conventos.
O(a) santo(a) não se afasta do mundo para encontrar a Deus; ele(ela) faz a
“experiência” do Deus agindo no mundo.
Aí
O encontra e caminha com Ele; o(a) santo(a) é aquele(a) que faz o que Deus faz
neste mundo, aquele que faz com que este mundo seja justo, santo, salvo. O
mundo não é só o “habitat” da sua missão: é sobretudo a fonte da sua espiritualidade,
o lugar certo para encontrar a Deus e escutar o Seu chamado.
Pondo-nos
na escola do Evangelho, é aqui, neste mundo, que Jesus nos chama a estender o
Reinado do Pai, trabalhando cada dia como amigos seus que passam, observam,
curam, se compadecem, ajudam, transformam, multiplicam os esforços humanos.
Apaixonados
pelo Reino, nos apaixonamos pelo mundo que, em sua diversidade, riqueza,
simplicidade, profundidade, fragilidade, sabedoria… nos fala com novos traços
do Deus que buscamos com desvelo. E amando e investigando tudo o que é do
mundo, adoramos o Deus Santo que habita em tudo.
O(a)
santo(a) seguidor(a) de Jesus é aquele(a) que, na liberdade, afirma: “Fora do
mundo não há salvação”. Ele(ela) descobre na realidade do mundo e da história os
“sinais dos tempos” e entra em comunhão com tudo, porque tudo é “diafania” de
Deus. Enraíza sua convicção nesta visão, nesta mística da presença de Deus em
sua obra, na contemplação de um mundo chamado a re-converter-se em justo e
belo, verdadeiro e pacífico, unido e reconciliado, entranhado em Deus, como no
primeiro dia da Criação.
A
vocação à santidade ativa em nós a paixão pelo Reino, mobilizando-nos a levar
adiante a missão, a ir aos lugares do mundo onde há mais necessidade e ali
realizar obras duradouras de maior proveito e fruto.
Como
seguidores(as) de Jesus, movidos(as) por um olhar novo, entramos em comunhão
com a realidade tal como ela é. Trata-se de olhar o mundo como “sacramento de
Deus”. Um olhar capaz de descobrir os sinais de esperança que existem no mundo;
um olhar afetivo, marcado pela ternura, compassivo e por isso gerador de
misericórdia; olharque compromete solidariamente.
O(a)
discípulo(a) missionário(a) não é aquele(a) que, por medo, se distancia do
mundo, mas é aquele(a) que, movido(a) por uma radical paixão, desce ao coração
da realidade em que se encontra, aí se encarna e aí revela os traços da velada
presença do Inefável; o mundo já não é percebido como ameaça ou como objeto de
conquista, mas como dom pelo qual Deus mesmo se faz encontrar. O mundo não é
lugar da exploração e da depredação, mas é o lugar da receptividade, da
oferenda e do encontro inspirador.
Para
realizar esta nobre missão, não podemos permanecer sentados. Seguir Jesus exige
de nós uma dinâmica continuada, um colocar-nos a caminho em direção às margens.
Não podemos viver o chamado do “Rei Eterno” a partir de uma cômoda instalação
pessoal. A disponibilidade, o despojamento e a mobilidade são exigências
básicas.
Corremos
o risco de viver em mundos-bolha; podemos construir nossa vida encapsulada em
espaços feitos de hábito e segurança, convivendo com pessoas semelhantes a nós
e dentro de situações estáveis. É difícil romper e sair do terreno conhecido,
deixar o convencional. Tudo parece conspirar para que nos mantenhamos dentro
dos limites politicamente corretos. Todos podemos terminar estabelecendo
fronteiras vitais e sociais impermeáveis ao diferente. Se isso acontece,
acabamos tendo perspectivas pequenas, visões atro-fiadas e horizontes
limitados, ignorando um mundo amplo, complexo e cheio de surpresas. Muitas
vezes “vemos” o diferente, mas só como notícia, como o olhar do espectador que
sabe das “coisas que acontecem”, mas não sente e nem se compadece por elas.
Viver
a santidade no mundo de hoje nos move a encontrar outras vidas, outras
histórias, outras situações…; escutar outros relatos que trazem muita luz para
a nossa própria vida. Olhar a partir de um horizonte mais amplo, ajuda a
relativizar nossos próprios absolutos e deixar-nos impactar pelos valores
presentes no outro. Escutar de tal maneira que o que ouvimos penetra na nossa
própria vida; isso significa implicar-nos afetivamente, relacionar-nos com
pessoas, não com etiquetas. Acolher na nossa própria vida outras vidas; abrir
espaços para que as histórias dos excluídos e diferentes encontrem morada nas
nossas entranhas, na nossa memória e no nosso coração.
O
encontro com o diferente possibilita também o encontro consigo mesmo, ou seja,
encontrar a própria verdade. Isso implica em se perguntar pela própria
identidade, por aquilo que dá sentido à própria vida, o impulso por viver de
uma maneira cristificada, conforme os valores do Reino.
Para
que haja verdadeiro encontro com o outro, o deslocamento expõe quem se desloca,
deixa-o vulnerável e “contaminado” pela realidade que encontrou. Quando alguém
se desloca e se aproxima de realidades diferentes, é para encontrar,
encontrar-se e aprender.
Como
discípulos(as)-missionários(as) de Jesus, nosso desafio não é fugir da
realidade, mas aproximarmos dela com todos os nossos sentidos bem abertos para
olhar e contemplar, escutar e acolher, percebendo no mais profundo dela a
presença ativa do Deus que nos ama com criatividade infinita, para
encontrar-nos com Ele e trabalhar juntos por seu Reino. O mundo precisa de
místicos(as) santos(as) que descubram onde está Deus criando algo novo, para
proclamar esta boa notícia.
Nós
cristãos honramos a santidade universal sem fronteiras de raça, de credo, de
cultura…Santidade é dizer sim à vida; é um caminho a ser percorrido “de dois em
dois”. Porquê esta insistência em fazer o caminho ao menos junto a outro(a)? Do
envio dos discípulos e discípulas de dois em dois, podemos tirar duas
consequências: uma para os momentos de fragilidade, de cansaço e de desânimo; a
outra para quando nos sobrevém inesperadamente a luz, a alegria…
Precisamos
fazer o caminho em companhia para poder estendermos a mão quando caímos, para
aprender a sustentar mutuamente… E, também de “dois em dois” para ter alguém ao
nosso lado com quem poder brindar, porque é uma ação que não é possível
realizá-la sozinhos. Celebrar, agradecer, brindar a vida… para isso, quanto
mais companheiros(as) de estrada, melhor.
Textos
bíblicos: Lc 10,1-12.17-20
Na
oração: Todas as narrativas acerca do chamado conservam a marca intencional de
um encontro surpreendente, inesperado e expansivo: deixar a vida estreita para
entrar no amplo espaço de vida proposto por Jesus.
Diante de Jesus, que “passa e chama” a todos, responda: como você vive, hoje,
sua missão no trabalho, no seu ambiente, na sua comunidade?
Que sentido você quer dar à sua própria vida?… em quê gastar suas forças,
capacidades?
Como viver, no seu cotidiano, sua vocação
de discípulo(a)-missionário(a)?
Fonte: Site CRB de São Paulo
Diante de Jesus, que “passa e chama” a todos, responda: como você vive, hoje, sua missão no trabalho, no seu ambiente, na sua comunidade?
Que sentido você quer dar à sua própria vida?… em quê gastar suas forças, capacidades?
Como viver, no seu cotidiano, sua vocação de discípulo(a)-missionário(a)?
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