“Um Menino é a resposta de Deus às nossas perguntas”
“Encontrareis um recém-nascido envolvido em faixas
e deitado numa manjedoura” (Lc 2,12)
Autor: Padre Adroaldo
Estamos em um tempo que nos fala
do essencial: um Deus que se faz carne, o divino que se faz humano; o eterno se
estremece diante do que é terno; o infinito abraça amorosamente a fragilidade…
Viver este mistério é viver em
Deus, compreender até onde chega a loucura de amor de um Deus que se humaniza
para que nos humanizemos. “A humanidade de Cristo é a humanidade vivida à
maneira de Deus, ou melhor, vivida por Deus” (José Arregi).
“Deus se humanizou”: tal
expressão revela que a Misericórdia de Deus significa também ternura.
Apareceu um Menino: apareceu a
ternura e a doçura do Deus que salva. Na fragilidade de uma criança se
esconde e se revela a grandeza divina. Uma antiga tradição religiosa afirma que
a maior seriedade de Deus aconteceu quando Ele virou menino. Louca
aventura amorosa de Deus!
No rosto de uma criança se faz
visível a Misericórdia que desce sempre mais abaixo, que nasce no ventre da
terra e se faz terra fértil.
Segundo Jacob Boehme, místico
medieval, Deus é uma Criança que brinca..
É nessa atmosfera “infantil” que
Deus se aproximou de nós. Não veio como um imperador poderoso nem como um
sumo-sacerdote ou um grande filósofo. Deus pode ser encontrado não na estrada
suntuosa do domínio e do poder, mas na estrada da doação, da partilha, da
solidariedade… A única explicação da “descida” de Deus é seu “amor
compassivo”. Ele mergulhou na nossa fragilidade fazendo-se uma criança pobre,
que nasce na periferia, no meio de animais, deitada numa manjedoura… para que
ninguém se sentisse distante d’Ele, para que todos pudessem experimentar o
sentimento de ternura que uma criança desperta e sobre quem nos
dobramos, maravilhados. Criança não infunde medo; todos se aproximam dela.
Pequenino com os pequeninos, Deus nos faz proclamar silenciosamente:
“Meu Deus, me dá cinco anos, me dá a mão, me cura de ser
grande…” (Adélia Prado).
É a fragilidade de uma criança que
ativa em nós a atitude da expectativa, da novidade, do assombro...
Cada nascimento é um sinal, um imenso milagre, uma bela
promessa, um profundo chamado. Viver é milagre. Só ser já é milagre. E o maior
milagre é a ternura que cuida, nutre, consola. Isso é “Deus”.
Dizia o pintor Pablo Picasso que
tornar-se criança leva tempo, e poderíamos acrescentar que somente o encontro
com o Deus Menino nos devolve a pureza e a inocência primordiais.
Quando nos fazemos presentes junto à Criança eterna, então brota em nós o
impulso para a renovação de vida, o despertar da inocência escondida, o encontro
com novas possibilidades de ação que correm em direção ao futuro.
O Natal é essa ternura
que ilumina a história humana, o cosmos do qual somos parte. É a confissão de
que a bondade gera e sustenta a vida. É crer que tudo está eternamente movido
por um pulsar profundo, criador, maior e mais poderoso que o universo, mais
terno e pequeno que o coração de um recém-nascido. É a promessa de que o bem
prevalecerá.
Ao recuperar o olhar de assombro
e de espanto no interior da Gruta de Belém, nossa mente se abre à
imaginação e ao sonho, começamos a considerar as infinitas possibilidades para
ser e conviver, brota a alegria do novo, do que está nascendo a cada instante,
de explorar recursos inéditos e desconhecidos.
Natal é o tempo para acolher com
ternura o que é germinal, o pequeno, o que nasce nos movimentos sociais e
humanitários alternativos e nos grupos eclesiais que se empenham por um mundo
novo e por uma Igreja mais sintonizada com o sonho de Deus. É o momento de sair
para os excluídos, para aqueles que não podem chegar até nós.
Ao entrar na gruta para
contemplar o Menino-Deus, conectamos, ao mesmo tempo, com o mais profundo do
coração humano, carregado de compaixão e generosidade. A bondade humana é uma
faísca que pode se atrofiar, mas jamais se apagar. São necessários alguns
momentos densos para que esta chama seja ativada. A vivência do Natal é um
deles.
Da “Gruta de Belém” à “gruta
interior”: esta é a aventura que nos leva a crescer, amar e compartilhar
com os outros o dom da vida; aprender a ver nas pessoas a grande reserva de
bondade, altruísmo e generosidade que carregam dentro de si; nunca
conformar-nos com a injustiça e a violência, semeando cordialidade e gentileza
a todos (as); e, sobretudo, ser mestres da esperança. “…porque é de
infância, meu filho, que o mundo precisa” (Thiago de Mello).
O Menino Deus, em
Belém, nos oferece uma maneira nova de olhar a realidade e a fragilidade de
tantas pessoas. A contemplação de Jesus em seu nascimento nos ensina a
contemplar a fragilidade e a exclusão humana como uma forma de presença
de Deus. Deus está entre nós como fragilidade, nos excluídos, nos pobres, nas
carências de todo tipo, em cada uma de nossas limitações. Por isso mesmo, sair,
descer ao encontro das carências humanas, é uma forma de peregrinação para o
coração do Deus mais vivo e surpreendente. Com os mesmos passos com que nos
aproximamos da fragilidade dos que sofrem, também nos aproximamos de Deus.
A partir dessa debilidade podemos
sentir que passa por nós a força de Deus, seu santo braço, que transforma, com
nossa ajuda, toda a realidade.
Se Deus correu o risco de
encarnar-se, de nascer pobremente e crescer como salvação a partir da exclusão
deste mundo, já não há excluídos para Ele, ninguém fica fora d’Ele. E o lugar
principal para a festa é ali onde Ele aparece: nos aforas, onde não há lugar,
onde tudo parece esgotar-se e é condenado a crescer em meio às ameaças e às
intempéries das situações humanas.
O Nascimento de Jesus é um
atrevimento, uma verdadeira ousadia, uma surpresa inimaginável…; na verdade, o
Natal é a manifestação do impossível que se faz possível no coração de Deus.
“Ele é o eterno Menino, o Deus
que faltava; o divino que sorri e que brinca; o menino tão humano que é divino” (Fernando
Pessoa).
Agora temos um Deus menino e não
um Deus juiz severo de nossos atos e da história humana. Quê alegria interior
sentimos quando pensamos que seremos julgados por um Deus Menino! Ao invés de
condenar-nos, ele quer conviver e entreter-se conosco eternamente.
Fonte: Site Seculo XXI
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