O Espírito da verdade.
O texto faz parte do “livro da comunidade”, também conhecido como o “livro da glorificação” (Jo 13-17). Após o gesto do lava-pés, Jesus faz um longo discurso de despedida. De modo afetuoso, anuncia aos discípulos a sua partida iminente. É um discurso que possui caráter de testamento. De coração aberto, Jesus revela tudo o que recebera de seu Pai e demonstra a íntima relação entre ambos. Os discípulos, porém, demonstram incompreensão diante das palavras de Jesus. Apesar de conviverem com Jesus por um bom tempo, permanecem num estágio de imaturidade espiritual. São incapazes de apreender o sentido verdadeiro do testamento de Jesus. Necessitam de ajuda.
O texto faz, então, referência ao Espírito Santo, que dará prosseguimento à missão de Jesus. Ele instruirá os discípulos e os libertará das amarras que impedem o reconhecimento do Salvador. É o Espírito que conduz à verdade plena que é o próprio Jesus Cristo, Deus encarnado, conforme já havia anteriormente se revelado: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14,6). A verdade é, pois, a própria realidade divina manifestada no amor de Jesus, que entrega sua própria vida em resgate da vida de todos. Jesus reza para que os discípulos sejam santificados na verdade (17,17.19) e possam viver na perfeita unidade, assim como ele e o Pai são UM (17,21-23).
A comunidade de João demonstra a sua caminhada de amadurecimento na fé em Jesus Cristo. As novas circunstâncias que emergem do contexto ao redor do final do século I exigem novas reflexões e novas posturas. Cresce a compreensão a respeito de Jesus, de sua íntima relação com o Pai e de sua missão de amor neste mundo. Ilumina-se, com maior profundidade, o sentido da morte e ressurreição de Jesus. Ele veio “para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (10,10). Os discípulos e discípulas são convidados a abrir-se às novas interpretações e exigências suscitadas pelo Espírito Santo no contexto histórico em que vivem. Prestar atenção no Espírito é assumir os desafios da história e viver, com novas expressões e novo ardor, o mesmo amor revelado em Jesus. As três pessoas divinas são manifestamente citadas no texto. Entre elas há perfeita comunicação e perfeito entendimento. Essa realidade divina, em toda a sua beleza e profundidade, é comunicada por Jesus aos seus discípulos.
O Pai deu tudo ao Filho; assim também o Filho dá a conhecer tudo o que recebeu do Pai aos seus filhos e filhas. Podemos aqui trazer presente o que são Paulo escreve: Todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. E vocês não receberam um espírito de escravos para recair no
medo, mas receberam um Espírito de filhos adotivos, por meio do qual clamamos: Abba! Pai! O próprio Espírito assegura ao nosso espírito que somos filhos e filhas de Deus. E, se somos filhos, somos também herdeiros: herdeiros de Deus, herdeiros junto com Cristo (Rm 8,16-17).
Celso Loraschi
Fonte: Revista Vida Pastoral
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